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Jornal O Diabo

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Porque não há Monarquia em Portugal?

Com a República minada pelo descrédito político e pela corrupção, e quando se comemora mais um Primeiro de Dezembro, a pergunta impõe-se: afinal, porque não se restaura a Monarquia em Portugal? A resposta é a mesma, desde há 77 anos: porque os republicanos “blindaram” o seu regime de forma inexpugnável. E, perante este muro intransponível, os próprios monárquicos nem sempre se entendem...


 

“A primeira medida de Salazar quando iniciou a chefia do Governo, em 1932, foi autorizar o funeral de D. Manuel II em Portugal. E assim ‘enterrou’ a Monarquia”. Quem o sublinha é o politólogo Adelino Maltez, citando a leitura que então fizeram da decisão alguns círculos monárquicos.

 

De facto, a chegada de Oliveira Salazar ao poder e o início do Estado Novo, em Julho de 1932, coincidiram com a morte, no exílio em Inglaterra, do último Rei de Portugal, D. Manuel II. Com o desfile da urna pelo Terreiro do Paço, no mesmo local onde, 24 anos antes, haviam sido assassinados o Rei D. Carlos e o Infante D. Luís Filipe, Salazar tentava “enterrar” a Monarquia em Portugal. Através do Estado Novo, a República conseguiu sobreviver e assim continuou até a 25 de Abril de 1974. Até hoje.

 

Reconhecendo que existe – evidência confirmada ao longo das últimas décadas – uma certa “paridade política ibérica”, é normal que se pergunte: se, em 1978, a Espanha conseguiu transitar de uma ditadura para uma Monarquia Constitucional, porque é que em Portugal não se verificou a mesma situação? Seremos nós “geneticamente oposicionistas” aos regimes monárquicos? A resposta pode ser polémica, sobretudo quando a República se prepara para festejar, em 2010, cem anos de vida.

 

Após o 25 de Abril, um Parlamento dominado por republicanos ferrenhos fez inscrever na Constituição um parágrafo que “blinda” a República com um escudo à prova de bala: a lei fundamental do País proíbe taxativamente a mera discussão do regime. Sob esta ditadura constitucional, não é permitida sequer a realização de um referendo sobre a verdadeira vontade dos portugueses – a menos que a Constituição seja alterada.

 

Declarações públicas de protesto e abaixo-assinados não têm conseguido, até hoje, inverter esta situação, embora se saiba que no hemiciclo de São Bento tomam assento muitos monárquicos, deputados de partidos do “centrão”. ‘O Diabo’ apurou, no entanto, que nos círculos monárquicos se estuda o lançamento de uma acção conjunta de grande envergadura com vista à revisão constitucional e à posterior convocação de um referendo. “Não está em causa a democracia”, comentou para o nosso jornal uma fonte da organização do movimento pró-referendo. “Na verdade, o século XX mostrou que há mais democracia do lado monárquico do que do lado republicano, tanto em Portugal como no resto do mundo. O que está em causa, e apenas, é a figura do Chefe do Estado, que os republicanos dizem que deve ser um Presidente e os monárquicos defendem que seja um Rei”.

 

Este debate pode, pois, vir a dominar as celebrações republicanas do centenário. Para apimentar ainda mais a discussão, o “lobby” monárquico prepara-se para sublinhar que a própria República nunca foi referendada nem submetida a qualquer ratificação popular, resultando apenas de um golpe de Estado que, pelas armas, substituiu um regime por outro. A acrescentar a isto, mantém-se acesa a polémica sobre o regicídio de 1908, que muitos consideram “o baptismo de sangue” da República. “Um regime instaurado sobre um homicídio acarreta, necessariamente, um complexo de culpa”, comentam as nossas fontes. “Por isso os republicanos nunca quiseram referendar o seu regime nem admitem que ele seja posto em causa constitucionalmente”.

 

Uma breve análise da História recente permite, em todo o caso, constatar que também do lado monárquico há responsabilidades por distribuir. Nem sempre estes se entendem, divididos por quezílias e divergências pessoais que não ajudam à causa da restauração. E até querelas doutrinárias e dinásticas envenenam o debate nas hostes realistas, contribuindo a seu modo para que não se alcance uma unidade que permita acções comuns no sentido de sentar na Chefia do Estado um Rei, como se verifica na maioria dos países da Velha Europa.

 

Para compreender a génese de algumas dessas divergências é preciso recuarmos, pelo menos, 175 anos no tempo, até 26 de Maio de 1834, dia em que se assinou a Convenção de Evoramonte, que pôs fim a dois anos de Guerra Civil, iniciada em 1832 entre os “liberais”, apoiantes de D. Pedro IV, e os “legitimistas”, liderados pelo seu irmão mais novo, D. Miguel. Em Evoramonte, este último aceitou capitular e abandonar o País.

 

D. Pedro IV, que abdicara do Trono do Brasil para lutar pelo direito constitucional da sua filha, D. Maria II, não viveria muito mais tempo: o vencedor da Guerra Civil faleceu de tuberculose, com apenas 32 anos, a 24 de Setembro de 1834, no mesmo quarto onde nascera, hoje conhecido por Sala D. Quixote, no Palácio de Queluz.

 

Desde esse “acordo” surgem dois ramos familiares que irão crescer em paralelo, mas reflectindo os lados que se opuseram durante a Guerra Civil de 1832-34: um, o “constitucionalista”, dos descendentes de D. Pedro IV (D. Maria II, D. Pedro IV, D. Luís, D. Carlos e D. Manuel II); outro, a facção “legitimista” (depreciativamente chamada “absolutista”), derrotada na Guerra Civil, exilada na Áustria, que se manteve representada por D. Duarte Nuno, pai de D. Duarte, o actual chefe da Casa de Bragança. Desta forma, D. Manuel II foi o último descendente de D. Pedro IV mas, quando morreu no exílio, em Inglaterra – para onde se expatriou após o golpe republicano de 5 de Outubro de 1910 –, não deixou descendência.

 

Tenhamos presente que a sua morte ocorreu na mesma altura em que Salazar formava Governo. Os monárquicos estavam, então, divididos entre aqueles que advogavam uma solução “liberal” e os que defendiam os direitos ao Trono da família de D. Miguel, exilada na Áustria. Naqueles anos difíceis para as contas estatais, consequência dos primeiros 22 anos da República, Salazar percebeu como essa cisão lhe poderia ser útil, tanto mais que a sua duvidosa fama de “monárquico” nunca teve qualquer proveito prático. Bem pelo contrário.             

 

Em 1933, um ano após a morte de D. Manuel II, último Rei de Portugal, era nítida a desunião entre os monárquicos portugueses: enquanto os “legitimistas” rumavam à Igreja dos Mártires, no Chiado, para a missa em memória do defunto Rei, os partidários dos descendentes de D. Miguel optavam pela Igreja de S. Domingos. É preciso não esquecer, nesta resumida abordagem, que ainda pendia sobre os descendentes de D. Miguel a Lei do Banimento, datada de 1834, em que se estabelecia que o Rei exilado e toda a sua futura descendência estavam apartados do direito sucessório ao Trono de Portugal (e até do direito de residência no País). Contudo, nos anos 50, Salazar aprovaria o regresso a Portugal da família de D. Duarte, atiçando com isso as quezílias entre as várias “facções” e conseguindo assim afastar possíveis obstáculos à sua forma de governação. Desta forma, também ele contribuía para a “blindagem” do regime republicano.

 

A generalidade dos monárquicos portugueses revê-se hoje em D. Duarte, chefe da Casa de Bragança com descendência assegurada, olhando com incómodo pequenos grupos contestatários (que prefeririam lançar para a ribalta “Reis” alternativos) e com ira os falsos “pretendentes” (como o siciliano Rosario Poidimani, que quando não está sob prisão, acusado de burlas e abusos de confiança, se afirma “herdeiro” de Maria Pia, cidadã italiana que se auto-proclamava “filha bastarda de D. Carlos”, entretanto falecida).

 

Em Outubro de 2008, durante um jantar da associação “Real Monarquia Portuguesa”, na cidade do Porto, D. Pedro Folque de Mendóça, 6º Duque de Loulé, descendente de D. Ana de Jesus Maria, a irmã mais nova de D. Pedro IV e D. Miguel, decidiu reivindicar “direitos dinásticos” que lhe adviriam dessa sua 4ª avó e apresentar-se como “pretendente ao Trono”. Contudo, Loulé admitiu então que “a minha decisão não prejudica o meu entendimento de que serão as Cortes, ou o Parlamento, que terão a palavra definitiva sobre esta matéria”.

 

Não será, contudo, difícil imaginar qual seria, na eventualidade de um debate parlamentar sobre a matéria, a decisão dos representantes do povo: o prestígio público de D. Duarte de Bragança parece inquestionável, sobretudo depois de ter constituído uma família e dado à causa monárquica a descendência que havia muito se aguardava. De resto, pressionado por declarações públicas do “pretendente” siciliano, o próprio Estado Português, consciente da necessidade histórica de identificar formalmente o herdeiro dos Reis de Portugal, acabou por confirmar D. Duarte, Duque de Bragança, nessa qualidade e condição.

 

A fundamentação do Estado baseava-se no “reconhecimento histórico e da tradição do Povo Português” e no “reconhecimento tácito das restantes Casas Reais da Europa e do Mundo, com as quais a Casa de Bragança partilha laços de consanguinidade”. Falando em nome do Estado, o então ministro Freitas do Amaral sublinhou que os Duques de Bragança “são várias vezes enviados a representar o Povo Português em eventos de natureza cultural, humanitária ou religiosa no estrangeiro, ocasião em que lhes é conferido o passaporte diplomático”.

 

Apesar de esta questão se encontrar aparentemente encerrada, outros factores de dissenção não têm permitido uma unidade de acção entre os monárquicos. São factores organizacionais, de concepção sobre a forma de articulação das várias “correntes” – mas são também factores doutrinários “de fundo”. Por exemplo, muitos realistas contestam que exista um “partido monárquico”, sustentando que a Monarquia não é uma questão partidária (mas sim de Chefia do Estado) e que os monárquicos podem aderir aos partidos da sua preferência ideológica, como em qualquer Monarquia Constitucional. Do lado oposto, critica-se a D. Duarte não se assumir mais abertamente como “líder activo” do movimento monárquico, promovendo “uns Estados Gerais” que traçassem uma estratégia para o futuro. Sobretudo atendendo à “vantagem mediática” que os republicanos tentarão obter com o centenário da República, em 2010…

 

O Herdeiro e os “pretendentes”

O nome mais consensual como Herdeiro do Trono de Portugal é o de D. Duarte, Duque de Bragança, descendente em linha directa do primeiro Monarca português, D. Afonso Henriques.

 

 

Como “pretendente” assumiu-se há um ano D. Pedro Folque Mendóça, 6º Duque de Loulé. Contudo, é pouco conhecido e não conseguiu ainda explicar satisfatoriamente porque resolveu contestar D. Duarte. Muitos monárquicos acusam-no de “divisionista” por ter trazido uma fonte de discórdia ao movimento realista num momento em que ele mais precisaria de unidade.

 

 

Rosario Poidimani pretende “aproveitar a confusão” e apresentar-se também como “pretendente”. As circunstâncias dúbias em que “herdou” os “direitos sucessórios” de uma cidadã italiana que nunca os teve, o seu conturbado percurso pessoal e ainda o facto de nem sequer ser português inutilizam-no para um debate sério sobre a questão.

 

Em última análise, qualquer pessoa poderia teoricamente tornar-se Rei de Portugal. Bastaria ver a sua pretensão legitimada pelos representantes do povo e ser aclamado em Cortes – como, de resto, sucedeu com D. João, Mestre da Ordem de Aviz, nas Cortes de Coimbra de 1385, que foi coroado D. João I e deu início à V Dinastia da Monarquia Portuguesa…

Da verdadeira bandeira de Portugal

Gonçalo Magalhães Collaço

 

Os recentes episódios e consequente polémica do hastear da bandeira azul e branca em lugar da actual bandeira da República Portuguesa, verde e encarnada, ou vermelha, como preferirem, na Câmara de Lisboa, Câmara do Porto e algures em Cascais, veio acima de tudo evidenciar o significativo grau de nevoeiro mental em que vivemos nos correntes dias em Portugal.


Antes de mais, a bandeira azul e branca de Portugal surgiu sempre referida nos relatos apresentados pelos meios de comunicação como a bandeira da monarquia, sem que se entenda exactamente porquê.

 

De facto, como qualquer pessoa medianamente culta sabe, a bandeira de Portugal sofreu profundas modificações, alterações e mutações, ao longo dos séculos, não constituindo a bandeira azul e branca senão a bandeira usada durante o período do designado liberalismo, ou seja, desde os anos 20 do século XIX até à implantação da República em 1910, após o assassinato, importa não o esquecer, do Rei D. Carlos e do seu filho D. Luís, em acto cobarde e vil, instigado, planeado e executado pela Carbonária, em 1908.

 

Após a implantação da República, os revolucionários, marcando a divisão profunda que existia na nação, é que decidiram mudar radicalmente a bandeira nacional, alterando-lhe as cores e subvertendo-lhe o espírito, se assim é lícito expressarmo-nos, criando para isso uma Comissão em que o relator foi Abel Botelho e da qual fazia inclusive parte, entre outros, também um Columbano Bordalo Pinheiro.

 

As alterações foram tudo menos pacíficas. Alguns dos mais notáveis republicanos, figuras porém mais sábias e atentas, entre outros aspectos, ao valor simbólico das cores, opuseram-se de forma veemente, como foi o caso de Sampaio Bruno e até de um Guerra Junqueiro.

A posição de Guerra Junqueiro não deixa de ser particularmente significativa porquanto, sendo um escritor tão admirável em tão múltiplos aspectos quanto censurável em tanto outros, não deixou de ser igualmente um feroz, implacável e quase se diria mesmo mortífero inimigo de D. Carlos, não se coibindo sequer de se dirigir ao Rei nos seguintes indignos termos:

 

“A tirania do snr. D. Carlos procede de feras mais obesas: do porco. Sim, nós somos os escravos dum tirano de engorda e de vista baixa. Que o porco esmague o lodo, é natural, O que é inaudito é que o ventre d’um porco esmague uma nação, e dez arrobas de cêbo, achatem quatro milhões d’almas! Que ignominia! Basta. Viva a república, viva Portugal!!”.

 

É certo terem-lhe custado essas palavras 50 dias de multa mais custas de processo de tribunal mas, para tanta tirania denunciada, fossem hoje as mesmas palavras dirigidas a qualquer Presidente da República em exercício de funções, e mais pesadas não deixariam com certeza de o ser, bem como outras as directas e indirectas consequências sofridas.

 

Fosse como fosse, não sendo a questão política quanto aqui nos importa considerar, nem o facto, segundo rezam as crónicas, de não ter deixado de se retratar no último período da sua longa vida, dos muitos e muito injustos exageros cometidos contra a figura do Rei, para além, segundo consta também, de se ter reconciliado inclusive com a Igreja e, segundo parece, até mesmo com a Realeza, ou, pelo menos, com a ideia da Realeza, Guerra Junqueiro não deixou de se afirmar, logo em 1910, como um dos mais estrénuos defensores da bandeira azul e branca:

 

“A bandeira Nacional é a identidade d’uma raça, a alma d’um povo, traduzida em cor. O branco simboliza inocência, candura unânime, pureza virgem. No azul há céu e mar, imensidade, bondade infinita, alegria simples. O fundo da alma portuguesa, visto com os olhos, é azul e branco. D’esse fundo saudoso, de harmonia clara, de lirismo ingénuo, ressalta, estudai-o bem, o brasão magnânimo: em campo de heroísmo… vermelho ardente, sete castelos fortes, inexpugnáveis, cinco quinas sagradas e religiosas, e à volta, num abraço bucólico, duas vergônteas de louro e de oliveira. É o escudo marcial e rural dum povo cristão de lavradores, que, semeando, orando e batalhando, organizou uma pátria. A coroa, que foi do escudo o fecho harmonioso, converteu-se há mais de dois séculos numa nódoa sinistra. Rajadas d’aurora limparam-na ontem para sempre. O nobre estandarte não tem mancha. Glorifiquemos o escudo, coroemo-lo de novo com diadema épico d’estrelas: estrelas de sangue e estrelas d’oiro, estrelas que cantem e que alumiem. Substitua-se apenas o borrão infame por um círculo d’astros imortais”.

(…)

 

Na verdade, ao abandonarmos o azul e branco abandonámos o mar onde o céu se espelha, a inocência e a abertura ao espírito, para atendermos sobretudo à terra e ao sangue. Deixámos de olhar e perscrutar o horizonte e perseguirmos os sonhadores voos de sempre mais além para nos fixarmos na segurança da terra firme e na cumulatividade vazia do passado. Deixámos de ser uma nação eminentemente marítima para, pouco a pouco, nos transfigurarmos numa farsa de nação pseudo-continental. Abandonámos o Atlântico para nos fixarmos na Europa de onde nos chegava todos os dias, de Paris, a civilização, com o vapor, como diria o Eça, uma forma mais irónica de dizer o que Pessoas também constatou ao afirmar termos começado a transfigurar-nos em franceses com o liberalismo para o devirmos completamente com a República.

 

É esse ainda o nosso drama de hoje, é esse o pecado original da República, o ter sido implantada contra Portugal, sem terem sido tidas em consideração as mais fecundas e perenes tradições nacionais, como a história recente largamente o demonstra e prova.

 

Por isso se afigura legítimo advogar e propugnar pelo regresso à bandeira azul e branca de Portugal, não apenas por simples razões estéticas, o que já não seria pouco, mas, acima de tudo, simbólicas.

 

Bem sabemos como, advogar hoje o regresso à bandeira azul e branca de Portugal, dado o nevoeiro mental em que nos encontramos submergidos, se afigura nada menos que temerário, para não dizer mesmo completamente disparatado.

Todavia, identificando a bandeira azul e branca com a “monarquia”, como vulgarmente se afirma, embora, em boa verdade, quanto se pretende afirmar é “realeza” e não “monarquia”, logo se enviesa todo e qualquer possível diálogo, enviesamento esse que está longe de ser inocente.

 

Em boa verdade, como sabemos desde Aristóteles, existem três Regimes Políticos puros, Monarquia, Aristocracia e Democracia, e outros tantos Sistemas Económicos puros, se assim podemos dizer, Capitalismo, Socialismo e Liberalismo, podendo entre si combinar-se indiferentemente, ou seja, um qualquer Regime Político é sempre susceptível de assumir um qualquer dos três Sistemas Económicos.

 

Avisado, realista, tópico, não desconhecendo a situação do mundo, do movimento do mundo, do movimento de geração e corrupção a que todas as entidades do mundo se encontram sujeitas, Aristóteles bem compreendendo também como toda a Monarquia sempre tende a degradar-se em Tirania, toda a Aristocracia a degradar-se em Oligarquia e a Democracia em Demagogia, preconizou o equilíbrio pela Poliarquia, ou seja, a instauração de um regime misto, composto e conjugando em simultâneo os três regimes puros, tal como tem vindo a suceder em toda a modernidade e acontece actualmente em Portugal. Ou seja, um Regime em que o elemento monárquico é dado na figura do Presidente da República, o elemento aristocrático é assumido pelo Parlamento e o elemento democrático manifestando a vontade da maioria, i.e., do povo, se encontra representado no Acto Eleitoral.

 

Porém, a Poliarquia, quando se ignora a si mesma, quando todos os seus elementos se ignoram a si mesmos, não pode deixar senão de igualmente se degradar, como hoje todos temos vindo a assistir, conjugando na comummente designada Partidocracia, um misto de Tirania, Oligarquia e Demagogia, tal como se verifica, revela e se sobreleva no drama da nossa actual situação política.

 

No nevoeiro mental em que mergulhámos, quando se refere o regresso à Monarquia, mais não se está a referir que o regresso ou reinstauração da Realeza, mas, assustados todos pela incapacidade de pensar, confundindo Realeza com Monarquia e, por condicionamento psicológico, emocional e sentimental, identificando Monarquia com Tirania, não há quem, num esgar de horror, não repudie de imediato tal possibilidade como indigna e profundamente ultrajante, mesmo humilhante, fora sequer pensar a eventualidade de tal possibilidade ser pensada.

 

Não é quanto importa aqui discutir neste momento mas, incapazes de pensar o regime Político, incapazes de atendermos aos símbolos, de compreendermos o significado de uma bandeira e quanto na mesma e pela mesma se significa, em boa verdade, quanto isso nos revela é quanto estamos hoje incapazes de pensarmos Portugal, sendo este, na realidade, o fundo do nosso mais grave, terrível e funesto drama actual.

o diabo que o carregue: Nuno da Câmara Pereira

Há muito que os verdadeiros monárquicos pressentiam (e alguns o sabiam para lá de qualquer dúvida) que o cançonetista Nuno da Câmara Pereira nada tinha a ver com as aspirações da causa realista, por mais presidente do PPM que fosse. Para quem estivesse atento, saltava à vista o seu estranho penduranço na República, bem patente durante uma triste e apagada passagem pelo Parlamento, nas bancadas do PSD. Depois de se voltar contra o Chefe da Casa Real, por razões que só um Ego doentio pode explicar, Pereira já se aliou a um aventureiro siciliano que pretende ser herdeiro do Trono de Portugal, já fez peixeirada de mão na anca a propósito da Ordem de S. Miguel da Ala e já pôs o seu minúsculo clube ao serviço das extraordinárias “aspirações” do Duque de Loulé a ser “rei”. Tudo o que de pior podia inventar-se para denegrir a Monarquia e mostrar pequenez e divisão, ele inventou. Agora, de novo concorrente a um lugarzinho na Assembleia da República, surge com um inenarrável cartaz de campanha em que se auto-proclama detentor de cinco-predicados-cinco, qual deles o mais excelso: “Honestidade, Integridade, Transparência, Ética, Verdade”. Tanta virtude junta serve-lhe para, em parangonas, dizer o que realmente lhe interessa: “Vamos, todos, ajudar a República!”, proclama Pereira no seu cartaz eleitoral. Quem tinha dúvidas, escusa já de tê-las. Está mais do que claro para que serve, afinal, o chamado Partido Popular Monárquico – um perigoso equívoco que consegue, sozinho, fazer mais estrago à causa monárquica do que todos os republicanos juntos.

FRA DIAVOLO

 

João Ferreira Rosa: “Não me importo nada de ser preso!”

Ainda os rapazes do site ‘31 da Armada’ não eram nascidos – e já o fadista João Ferreira Rosa hasteava todos os dias a bandeira azul e branca no mastro de sua casa. “O Diabo” foi ouvir um dos mais destacados defensores da Monarquia em Portugal.

 

“O Diabo” – A Monarquia é fácil de explicar ao povo, 99 anos depois da instauração da República?

João Ferreira Rosa – Facílima. Há doutores que podem fazê-lo com grandes tratados. Mas sabe quem pode explicá-la melhor? Os portugueses (e são mais de um milhão) que vivem e trabalham nos países onde há Monarquia: na Holanda, no Canadá, na Austrália, na Suécia, na Inglaterra, no Luxemburgo, em Espanha, na Bélgica. Só que esses não passam na televisão. Dantes havia uma censura, agora parece que cada qual tem a sua…

 

“O Diabo” – Porque é que é monárquico?

J.F.R. – Não quero ter um Chefe de Estado eleito. O Rei não é de facção nenhuma nem lhe sobe a importância à cabeça: é importante desde que nasce e representa todos. O Rei é o chefe natural da nossa família comum.

 

“O Diabo” – Acha que os monárquicos têm conseguido “fazer passar a mensagem”?

J.F.R. – Há por aí alguns condes e viscondes, falsos monárquicos, que dizem que o povo não está preparado. O único que está preparado é o povo. O povo está preparadíssimo! Eles é que não querem Rei. São uns snobs. Acham que ser monárquico é ser nobre. Nobre? Mas querem gente mais nobre do que o povo? A esses condes e viscondes, o Senhor D. Carlos não dava confiança. Queixavam-se de que o Rei não tinha Corte! Pois não: a Corte do Rei era o povo! Ele ia para Vila Viçosa e era com o povo que queria estar.

 

“O Diabo” – Quais são as desvantagens de um Presidente eleito?

J.F.R. – Desde logo, só se pode concorrer à Presidência apoiado por muito, muito dinheiro e um partido político. Portanto, ganha quem tem mais dinheiro e representa uma facção. Sabendo como a República foi feita, só uma pessoa desonesta pode querer candidatar-se a Presidente. A República foi feita por meia-dúzia de traidores, assassinos e ladrões. Quando assassinaram o Senhor D. Carlos e o Príncipe, em 1908, até os republicanos franceses disseram: ‘Mataram o Rei mais culto da Europa’. No dia 5 de Outubro, aquela Câmara Municipal de Lisboa, onde agora estes rapazes hastearam a bandeira nacional, era uma galeria de gente horrível. O José Relvas e todos os outros. Uns criminosos. Mataram gente. Não eles, pessoalmente: mandaram a Carbonária. São figuras sinistras. A instauração da República é um filme de terror. Por isso nunca a referendaram. Nenhum país no mundo tem uma ditadura com 100 anos, como nós temos. E não se pode dizer isto. Ninguém me convida para ir à televisão dizer isto. E quando me convidam para cantar, querem sempre que cante ‘O Embuçado’ e umas coisas inocentes. É tenebroso. Ainda no outro dia me fizeram uma entrevista para uma televisão e estiveram a gravar mais de uma hora. Eu só lhes dizia: ‘Mas para quê gravar tanto tempo, se não vai sair nada do que eu estou a dizer?’. Claro: saíram três frasesinhas, a respeito de Fado…

 

“O Diabo” – Portugal tinha uma boa Monarquia?

J.F.R. – Tinha uma Monarquia exemplar, comparada com as outras. Ainda há tempos estiveram aqui uns noruegueses e disseram a quem os quis ouvir: ‘Vocês, com a História que têm e com os Reis que tiveram, tinham obrigação se ser monárquicos’. A República assenta num lago de sangue. É um crime que nunca foi julgado. Não foi o povo que matou o Rei. Os maiores democratas que nós tínhamos eram o Senhor D. Carlos e a Família Real. O Alfredo Marceneiro contava isso. Ele era operário, nessa altura, vivia em Santa Isabel e assistiu ao 5 de Outubro. Houve um dia um programa de fados na televisão, feito em Pintéus, e gravaram uma conversa minha com o Marceneiro. Como era 5 de Outubro, eu perguntei-lhe: ‘Tio Alfredo, o que é que esta data lhe diz?’. E ele respondeu: ‘Sim, filho. Eles, primeiro, mataram o Rei e o Príncipe. Em Lisboa, o povo ficou a chorar. Passados dois anos, andaram grupos pelas ruas, aos tiros e aos gritos, a dizer ‘não saiam de casa, é uma revolução’. O povo acobardou-se e eles fizeram a República’. E foi mesmo assim. A República foi feita em Lisboa e o resto do País soube pelo telégrafo. O povo não teve nada a ver com isso. E ainda hoje eu vejo muito pouca gente a intitular-se republicana. São raros.

 

“O Diabo” – O povo é monárquico?

J.F.R. – Aqui em Alcochete, por exemplo, muito povo é monárquico. Depois do 5 de Outubro, o barco de ligação a Lisboa continuou durante anos a içar a bandeira real. E só acabaram por desistir porque, quando chegavam a Lisboa, tinham a Guarda Republicana em cima deles.

 

“O Diabo” – E continuam monárquicos?

J.F.R. – Eu até tenho amigos comunistas monárquicos!

 

“O Diabo” – O facto é que vivemos em República…

J.F.R. – Pois se a Constituição nem sequer permite que se ponha em causa o regime! É uma vergonha. E agora, na próxima Assembleia, que terá poderes constituintes, não acredito que tenham a coragem de mudar. O Medina Carreira é que os topa! Esse grande senhor daria um grande conselheiro do Rei de Portugal. Diz as verdades. Só que depois nada acontece. Ele chama-lhes ladrões, chama-lhes tudo, mas eles não têm a coragem de levar o senhor a tribunal. Se isto não levar uma volta, eu não vou morrer cidadão da República Portuguesa. Não há ninguém mais português do que eu. Mas morrer debaixo da bandeira da República, isso não. Mais vale ir morrer longe.

 

“O Diabo” – A República vai fazer 100 anos. Que acha que deviam os monárquicos fazer em 2010?

J.F.R. – Devíamos exigir o referendo. A melhor comemoração era fazer-se o referendo sobre o regime no dia 5 de Outubro de 2010. Isso é que era.

 

“O Diabo” – Acompanhou os casos dos jovens monárquicos que substituíram a bandeira republicana pela bandeira azul e branca…

J.F.R. – A mim nasceu-me uma alma nova com esta gente. Fiquei orgulhoso. Senti-me recuar aos 20 anos. O que incomoda ainda mais a corja republicana é que são jovens. Porque isto desmente a propaganda republicana de que a Monarquia é uma coisa de velhos. Eu sou monárquico desde que comecei a pensar, desde rapazinho. Sou monárquico por pensamento, não por herança de sangue.

 

“O Diabo” – Acha que este caso vai ter consequências?

J.F.R. – É preciso que estes bravos sejam julgados! É preciso fazer coisas, como eles fizeram, para sermos julgados e podermos dizer em tribunal o que se impõe que se diga! É uma infâmia não nos deixarem falar. Eu, com 72 anos, não me importo nada de ser preso como monárquico! Teria o maior orgulho! A República é um crime que continua por julgar.

 

Monarquia restaurada na varanda da Câmara!

Os autores do blogue “31 da Armada” reivindicaram ontem um hilariante “atentado” político: por breves horas, conseguiam restaurar a Monarquia – se não em Portugal, se não em Lisboa, pelo menos no varandim dos Paços do Concelho, o mesmo de onde, em 5 de Outubro de 1910, José Relvas proclamou unilateralmente a instauração da República.

 

“Aqui, posto de comando do Movimento do 31 da Armada”, dizia a proclamação dos autores da partida. “Durante a madrugada de ontem, e apesar da forte vigilância policial, elementos do ‘31 da Armada’ subiram heroicamente até à varanda do Paços do Concelho e hastearam a bandeira azul e branca. Há 99 anos atrás, no dia 5 de Outubro, um punhado de homens, contra a vontade da maioria dos Portugueses, tinha feito a mesmíssima coisa proclamando assim a república. O resto do país ficou a saber por telegrama. Hoje, aproveitando as férias de verão e numa inédita acção de guerrilha ideológica, foi restaurada a legitimidade Monárquica. Podem permanecer calmos nas vossas casas: foi restaurada a Monarquia. E o país fica a saber pela internet. É o contributo do ‘31’ para as comemorações do centenário da república”.

 

O mais curioso foi que a bandeira da Monarquia Constitucional esteve hasteada toda a manhã de 2ª feira: só ao meio-dia os serviços camarários deram por ela…

 

Esta semana n'O Diabo

Na edição desta semana do Semanário O DIABO:

 

► Acordo com a Liscont escrutinada:

Procuradoria avança com investigação ao “negócio dos contentores” que beneficiou a Mota-Engil de Jorge Coelho

 

► O estado calamitoso da Economia portuguesa:

Já perdemos 200.000 pequenas e médias empresas desde que Sócrates é primeiro-ministro – denuncia Augusto Morais, presidente da Associação Nacional das PMEs

 

► “Não sou herdeiro do soarismo”, diz João Soares numa entrevista franca e descomplexada em que explica porque se candidata por Faro

 

► Guerra política transfere-se para a Internet:

As “barbaridades” que políticos, jornalistas e comentadores andam a escrever nos blogues, no Facebook e no Twitter

 

► Floresta portuguesa em risco de desaparecer:

As pragas estão a atacar sobreiros, azinheiras e pinheiros – e as associações de produtores acusam o Governo de nada fazer

 

► Testemunho:

As memórias de um serviçal do Palácio de Belém que trabalhou com sete Presidentes da República

 

► Opinião:

Artigos de Alberto João Jardim, Brandão Ferreira e Francisco Moraes Sarmento e ensaio de Adam Lerrick 

 

► “Atentado” na Câmara de Lisboa: bloguistas hasteiam bandeira monárquica nos Paços do Concelho!

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